O mito de Eros e Psiquê – parte 2
Como prometido, hoje conto pra vocês a segunda parte do mito de Eros e Psiquê. Na primeira parte, Psiquê trai a confiança de Eros e por isso é expulsa do palácio em que vivia com ele. Ela se vê de volta à montanha na qual foi deixada por sua família para se casar com Eros. Seu sentimento é de desespero e dor profunda.
Sem saber o que fazer para recuperar o amor perdido, a princesa passa a vagar pelo mundo. Desesperada tenta se matar e não consegue, vaga de cidade e cidade, maltrapilha e quase enlouquecida pelo desespero. Mas estava decidida a reconquistar a confiança de seu amado, e tinha dentro de si a força de quem ama. E por isso decide procurar um templo de Afrodite, a deusa do amor, e também sua sogra.
E Afrodite não era uma sogra boazinha. Pelo contrário. A essa altura, já sabia que o filho a havia desobedecido casando-se com Psiquê, e tudo mais que aconteceu a partir daí. Ela estava furiosa com a esposa de Eros, e pronta para impedir que eles ficassem juntos novamente. Quando Psiquê foi procurá-la, Afrodite disse-lhe que somente a deixaria ver Eros novamente depois de passar por algumas tarefas. A ideia da deusa era que as tarefas fossem impossíveis, assim a jovem jamais veria seu filho de novo. Eros, por sua vez, se encontrava enfermo, ferido, sem saber o que acontecia.
No templo de Afrodite, a deusa deixou Psiquê em uma sala, onde havia uma montanha enorme, com todos tipos de grãos. Eles se encontravam misturados e a sala estava muito bagunçada. Psiquê teria que separar todos os grãos por tipos e organizá-los antes de anoitecer. Entendendo que sua tarefa era impossível, começou a chorar de desespero, quando viu se aproximarem várias formigas. As formiguinhas começaram a trabalhar separando os vários grãos. Com essa ajuda, Psiquê conseguiu cumprir sua primeira tarefa, para a surpresa de Afrodite.
A deusa não ficou muito contente, como podem imaginar, e tratou de passar outra tarefa para a princesa. A tarefa seguinte, era praticamente uma tarefa à altura de Hércules. Afrodite determinou que a jovem fosse até as margens de um rio onde carneiros de lã dourada pastavam e trouxesse um pouco da lã de cada um deles. Esses carneiros eram ferozes e não deixavam que ninguém chegasse perto deles para tocar em sua lã de ouro. Mais uma vez Psiquê teve ajuda da natureza. Quando estava pronta para cruzar o rio, ouviu um junco dizer que não atravessasse até que os carneiros se pusessem a descansar sob o sol quente, quando ela poderia aproveitar e cortar sua lã. Assim, Psique esperou até o sol ficar bem alto no horizonte, e, observando que os carneiros adormeciam, atravessou o rio e levou a Afrodite uma grande quantidade de lã dourada.
Certa de que a garota morreria ao tentar realizar a tarefa, Afrodite ficou ainda mais furiosa ao vê-la voltar com a lã dourada. Ela decide então que Psiquê deveria trazer para ela em uma jarra de cristal, a água da nascente do rio Estige. A nascente do rio ficava no cume de uma montanha muito íngreme e acesso praticamente impossível. O rio, era o mesmo que banhava o mundo dos mortos. Nascia no alto de uma montanha e em sua descida, desaparecia sob a terra, entrando no reino de Hades, para depois reaparecer novamente na superfície e indo desembocar perto de sua nascente. Por ser tão sombrio, o rio atraía todo tipo de criatura sinistra e sua nascente era guardada por perigosos monstros.
Psiquê se via sem escolha, e mesmo com o cansaço, a fome, o desespero e a tristeza que sentia, no fundo tinha esperança e foi enfrentar sua tarefa. Ela não sabia muito bem como começar, mas tratou de ir até a montanha e a escalar levando consigo a jarra de cristal. Escalava com as mãos e pés nus, que se feriam no tortuoso trajeto. A essa altura, Eros já havia se recuperado e há muito perdoado a mulher amada. Ele descobriu todo o sofrimento pelo qual Afrodite a estava fazendo passar e foi pedir ajuda ao senhor dos deuses, Zeus. Quando vêem, lá estava Psiquê escalando a montanha, com pés e mãos sangrando. Zeus, comovido, envia sua águia de estimação para ajuda-la. A magnífica águia pega a jarra de cristal, voa até o rio, enche a jarra e a traz de volta para Psiquê. E assim, a princesa consegue realizar a terceira tarefa.
Inconformada, Afrodite decide que é hora de dar uma tarefa realmente impossível de ser realizada por uma simples mortal. Disse à princesa que por ter que cuidar de Eros que estava muito adoentado, tinha perdido um pouco de sua beleza, e ordena a Psiquê vá até o reino dos mortos e consiga com Perséfone um pouco do seu elixir de beleza. Sem ter ideia de como chegar ao mundo dos mortos, acreditava que a única maneira de ir até lá seria morrendo. Sobre então no alto de uma torre para se jogar, quando a própria torre a ajuda. A torre murmura instruções de como entrar em uma determinada caverna para alcançar o reino de Hades. Disse-lhe, que ao chegar lá, encontraria Caronte, o barqueiro do mundo inferior, que transportava a alma dos mostos na travessia do rio Estige até os reinos dos mortos. Ela teria que dar uma moeda a Caronte como pagamento pela travessia. Avisou também sobre o cão de três cabeças que guarda os portões do Hades, Cérbero, e, que, para passar por ele deveria alimentá-lo com apenas um pão, para que as cabeças briguem entre si, e com a distração ela possa passar com tranquilidade.
Assim Psiquê faz, e depois de uma longa jornada chega ao submundo. Comovida com o sofrimento da jovem, Perséfone entrega de bom grado um pouco do elixir de beleza que Afrodite solicitou, e adverte a Psiquê que não abra a caixinha em momento algum.
Psiquê teria completado com êxito a sua tarefa se não fossem a curiosidade e a vaidade. Convencida de que não estava tão bela quanto antes por causa das árduas tarefas, no caminho de volta, Psiquê ficou tentada em abrir a caixinha e usar um pouco daquele elixir. Afinal, seria tão pouquinho que Afrodite nem ia notar que ela tinha usado… E ela abriu a caixa. Como tudo que é referente aos deusas, aquilo não fora feito para os olhos humanos. Foi só dar uma olhada dentro da caixinha, que Psiquê desmaiou e caiu em sono profundo.
Ali teria sido seu fim, se Eros, já completamente curado, não tivesse voado ao seu encontro. Encontrou a amada já desacordada, fechou a caixinha colocando de volta lá dentro todo o elixir, e com um beijo fez a amada acordar do sono dos mortos que a havia acometido. Ela mal pôde acreditar nos seus olhos, ao abri-los e ver que estava nos braços de seu amado. Eros a olhava entristecido, mas com profundo amor, e a aconselhou.
“- Mais uma vez a curiosidade te traiu, minha amada. A curiosidade e a vaidade. Mesmo cansada, sacrificada, eu te acharia bela, e não precisaria de artifícios de beleza para ter o meu amor. Agora pode cumprir esta última tarefa, mas jamais se esqueça das coisas importantes que aprendeu.”
Dito isto, Eros levou Psiquê até Afrodite. Psiquê humildemente entregou a caixinha a Afrodite, que ainda estava bastante enraivecida com tudo aquilo. Mas Eros havia já pedido ajuda a Zeus para que ajudasse a apaziguar o coração da deusa. Afrodite acabou aceitando a nora, e numa nova e lindíssima cerimônia, Eros e Psiquê casaram-se novamente, agora com o consentimento de todos os deuses do Olimpo. Zeus pediu a seu filho Hermes que desse Ambrosia à Psiquê, e a cerimônia não foi só um casamento, como também a aceitação de Psiquê como deusa. Agora, graças à Ambrosia, Psiquê também era imortal, uma linda deusa com asas de borboleta. Com o tempo, tiveram uma filha chamada Prazer.
Eros – o amor, e Psiquê – a alma, são a expressão mais pura da união do amor e da alma. A alma só consegue conhecer a mais pura expressão do amor após se depurar com os sofrimentos que enfrenta. No início ela ama cegamente sem saber quem é de fato o marido. A luz do lampião ilumina, mas trás a luz a traição. E a reconquista da confiança perdida se dá à duras penas. Para que no fim, a verdadeira felicidade, venha com a verdade, a luz, o conhecimento do outro, o conhecimento de si mesmo e da própria força, e a aceitação do amado mesmo com seus defeitos.
Espero que tenham gostado e que este lindo mito os ajude, de alguma maneira, a refletir.
Beijos e até a próxima!
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